11 de novembro de 2009

AS LUZES DE UM ENSAIO


O disco amarelo iluminou-se.

Sim. Nessa versão do nosso mundo, também se iluminou. Lá onde quase ninguém olha. Onde o que se acredita ser humano diz que foca, mas, no fundo, nem tão fundo, bate o olho e ignora. Pois, se pudesse olhar, veria. Se pudesse ver, repararia. Lá onde ponto cego é borrão em abundância. Onde o tonto se perde, na bruma de sua própria ignorância. Pois, se pudesse achar, teria. Se pudesse ter, dividiria. O disco amarelo iluminou-se. Sim. Nessa versão do nosso mundo, também se iluminou. Todavia, da ocasião, o desatento passa ao largo. Um uníssono brado. Apagou.

Ele sopra ao meu ouvido. Meu conformismo se apaga, uma chama acende. Magia? Não. Não é preciso de magia para um sopro invadir a janela da minha alma. Ele é mais que um mago. Ele é muito mais que o mago. Ele sopra ao meu ouvido. Um vendaval versado em raro linguajar disparatado. Escreve sobre as retinas do meu peito o doloroso contorno moral de um mundo devastado. Seu mundo. Meu mundo. Nossos mundos. Territórios assolados por outros vendavais tão análogos. Não à toa, temos punhos e corações acelerados. Angustiados. Como seu alter ego que tudo vê, ouço pela janela a degradação dos meus coadjuvantes. Todo o excremento do que se acredita ser humano vindo à tona de um modo instantâneo e arrasador jamais visto antes. Mais que um desastre natural. Como se isso não fosse natural... Ouço pela janela porque não posso olhar. Digo que não posso, mas, no fundo, nem tão fundo, digo porque não quero olhar. Pois, se pudesse olhar, veria. Se pudesse ver, repararia. Amarga ilusão. Não dá mais. Olho. Vejo. Reparo.

Sim. Olho. Vejo. Reparo. A barbárie aflorando em um sem número de esquinas da cidade. Do meu mundo que não aprende com a idade. Flores espinhosas que quase cortam minha alma fora. Poucas vezes, a noite foi tão silenciosamente estrondosa. Poucas vezes, luz, som e suas ausências foram tão contraditórios. Contraditórios. Contraditórios. Contraditórios. Contraditórios. Contraditórios. Contraditórios. Silêncio. Hiato. O panóptico do sábio. Sim. Olho. Vejo. Reparo. Reparo-me. Reparo o mundo outra vez. E me reparo. Onde há espinhos, há pétalas. Delicadas ou não, pétalas. Pétalas que parecem florescer mais fortes em meio às trevas. Banhadas de afeto, de solidariedade, de benevolência pura ao seu coadjuvante. Seus coadjuvantes. No meio do crepúsculo, alguns puderam achar. Se achar. E aquele que se acha, tem. Aquele que tem, divide.

Lembra-me o sopro que somente num mundo de cegos é que as coisas são o que verdadeiramente são. A clareza dos antagonismos emerge. Eles coexistem.

Sim. Realmente, são.

As luzes se acendem. Baixo meus olhos.

A cidade ainda está aqui.




PS: dedicado a José Saramago e Fernando Meirelles que me brindaram com os contornos do seu mundo, poucas horas antes da minha escuridão. Da nossa escuridão.

10 de novembro de 2009

SILÊNCIO


Hiato entre o calar
...
E o falar

Panóptico do sábio
Refúgio do covarde
No silêncio
...
Eu meedito