30 de outubro de 2009

O PREÇO DO AVESSO


Sou o berro do criado-mudo
A soberba de quem criou o mundo
A conversa que logo desconverso
Um verso de cabeceira engavetado

Sou o erro bem intencionado
A tensão e o tesão da puberdade
A verdade que há na sacanagem
Um ato só em minha própria homenagem

Sou o veto à voz do viva voz
A censura doce no talvez de meus avós
A tradição e a contradição dentro de mim
Um não azedo que hesita em gritar sim

Sou o sol que se recusa a ser menor
A luz que apaga, mas insiste no “acorde!”
Meio Tom, meio Jerry, mil metades
Um suicida quando caço sem dó ou piedade

Sim
Não sou santo, nem encanto
Nada além do tanto quanto canto
E, no meu canto, prendo o pranto
Enquanto conto o que restou
De mim

13 de outubro de 2009

DOCE LAR




Estranho.
Como assim, tão de repente, me ameaça de voltar? Dias de ignorância, noites de rejeição. Anos de desprezo e vem bater à minha porta, agora, pedindo para entrar?
Bate. E bate forte. Cada vez mais forte.
Corte.

Estranho-a.
Diz-me então. Por acaso. Lembra bem o quanto sou difícil de lidar? Dias de alegria, noites de aflição. Lembra de quantas e quantas vezes deixamos outros a chorar?
Não. Não é acaso. É claro.
Ocaso.

Não é mais claro. Nada é mais claro.
O crepúsculo das minhas certezas me confunde. Você me confunde.
Sem rosto. Sem nome. Sem cautela.
Sem prudência. Minha Querida Prudência que, finalmente, sai para brincar.
Ninguém lhe conhece. Apenas eu. Só e somente eu.

Estranho-me.
Você me confunde.
E se funde. A mim. Aos meus dias, às minhas noites, à minha porta.
Nossa porta.
Bata à nossa porta. Forte. Mais forte.
Bata e me faça lembrar. Calar. Olhar.
Como é bom lembrar.

Não sei se a quero. Só sei que quero.
Você. Minha infiel companheira. Minha mais seca lamúria.
Recém desperta.
Angústia.

12 de outubro de 2009

NOSSAS CORES



O amarelo que vês é o amarelo que vejo?
E teu branco?
E teu preto?
O teu tudo tem cor e o teu nada é branco?
Ou o branco é nada e tudo é preto?

Entender nossas visões foi sempre difícil.
Teu choro era azul
Em belos olhos verdes.
Meu sorriso era vermelho
Em lábios que matavam tua sede.

Nós somos dois, não somos um.
Escolhe a tua cor, que eu escolho a minha.
Pinta tua noite, que eu pinto o meu dia.
Porque, amanhã, nossa história continua a ser contada na parede da vida.

NOVO DIA, NOVAS CORES



Mais um dia vai chegar
Dia de retocar a tal parede
De relembrar a nossa sede
De reencontrar e enxergar
Como brilhará o que era verde

Mais um dia vai chegar
E o que terá mudado em teu olhar?

Em ambos

No teu verbo
Teimoso em interpretar
E no teu substantivo
Razão de, um dia, por ti,
Eu me apaixonar

Mais um dia vai chegar
E que cor avivará o teu chorar?
Secaremos aquele azul angustiante?
Transformá-lo-emos em algo cambiante?
Ou continuaremos repetindo como antes?

Mais um dia vai chegar
E as respostas
Como as cores
Esse dia vai nos dar

6 de outubro de 2009

12 DE OUTUBRO


Outro dia, uma pergunta surgiu.
“Por que, quando crianças, o viver nos parece mais intenso e verdadeiro?”.

Primeiramente, porque, quando crianças, a nostalgia não existe. Afinal, fica difícil nos apegarmos às poucas memórias passadas que mal conseguimos gravar.

Além disso, não atrelamos nossa felicidade às projeções feitas para dias que virão. Ou seja, não vivemos (“existimos”? ) de expectativas, de conjecturas.

Quando crianças, nosso foco está no nosso presente, no dia que estamos vivendo. Não perdemos tempo nos lamentando por hoje não ser como ontem, nem divagando sobre a possibilidade de amanhã ser melhor do que hoje. Simplesmente, nos esforçamos para fazer do agora o melhor momento de nossas vidas.

E nós, presunçosos que somos, ainda tentamos ensiná-las como crescer.